Thursday, March 16, 2006

Diário de um Fermentador - Dia 2


Agora falta saber com qual bichinho com o qual vou realizar as fermentações. E eis que surge a Pichia pastoris! É uma levedura ascoporogénica, metilotrófica, da família Saccharomycetaceae, da ordem das Saccharomycetales, que tem vindo a ser muito utilizada como hospedeiro para a expressão de uma enorme variedade de proteínas recombinantes quer a escalas de bancada quer à escala piloto.

À primeira vista a Pichia parece ser o hospedeiro ideal, visto que é um microrganismo simples, que é capaz de crescer em meios definidos baratos e produz altas densidades celulares (mais de 130 g de peso seco celular l-1) usando protocolos de fermentação bem desenvolvidos.

É usada para a expressão de proteínas heterólogas por três razões principais: pode ser facilmente geneticamente manipulada, pode expressar e excretar proteínas a elevados níveis, e possui o potencial para realizar muitas das modificações pós-transcrição tipicamente associadas com os eucariótas superiores, como o processamento de sequências sinal (quer tipo pré quer tipo prepro), folding, formação de pontes de dissulfureto, adição de certos tipos de lípidos, glicosilações O- e N- linked e processamento proteolítico.

Assim para termos a certeza que as nossas proteínas de interesse são fortemente expressas, temos de as associar a um promotor forte, e visto que algumas proteínas heterólogas podem ser tóxicas para as próprias células, se este promotor for facilmente controlável tanto melhor! De forma a iniciamos a produção das proteínas a em fases perfeitamente definidas por nós. É aqui que entra o promotor AOX1.

Numa breve explicação, existem dois genes que codificam a álcool oxidase em P. pastoris: AOX1 e AOX2, sendo o AOX1 é responsável por mais de 90% da proteína. O promotor AOX1 é induzido pelo metanol mas é reprimido por outras fontes de carbono como glucose, glicerol e etanol, e ele é: “one of the most efficient and tightly regulated promoters ever known” – Ah pois é!

A AOX catalisa o primeiro passo na via de utilização de metanol, visto que a Pichia pastoris é capaz de utilizar o metanol como única fonte de carbono, e realiza a oxidação do metanol a formaldeído e peróxido de hidrogénio. A AOX está sequestrada dentro do peroxissoma juntamente com a catalase, que degrada o peróxido de hidrogénio a oxigénio e água. Uma porção de fomaldeído gerado pela AOX abandona o peroxissoma e é posteriormente oxidado em formato e dióxido de carbono por duas desidogenases, reacções estas que são fonte de energia para as células que crescem em metanol.

A expressão do gene AOX1 é controlado ao nível da transcrição. Em células crescidas em metanol, cerca de 5% do poli(A)+ do RNA é da AOX1; porém, em células crescidas na maioria das outras fontes de carbono, AOX1 mensageiro é indetectável. A regulação do gene AOX1 parece envolver dois mecanismos: um mecanismo repressão/desrepressão e um mecanismo de indução, com uma regulação similar ao gene GAL1 da Saccharomyces cerevisiae. Ao contrário da regulação do GAL1 a ausência de uma fonte de carbono, como a glucose no meio, não resulta numa transcrição substancial da AOX1. A presença de metanol é essencial para induzir altos níveis de transcrição. Porém altas concentrações de metanol são tóxicas devido à acumulação de formaldeído e peróxido de hidrogénio dentro das células. Assim uma regulação precisa da concentração de metanol na fermentação por parte de Pichia pastoris é vital não só para manter o estado de indução dos genes que se encontram sob o controlo do promotor AOX1 mas também para prevenir a acumulação de metanol a um nível tóxico.

A expressão de proteína heteróloga sob o controlo de PAOX1 permite o design de uma estratégia de cultivo que proporcionam alta densidade celular para produção de proteínas heterólogas a níveis elevados, descritas em duas fases principais. A primeira fase tem como princípio gerar biomassa utilizando fontes de carbono que levam a uma superior produtividade substracto-biomassa, como o glicerol, uma segunda fase, na presença de metanol, para a indução da produção de proteínas heterólogas.

Amanhã vou escolher as melhores estirpes para a fermentação.

Au demain!

2 Comments:

At 3:05 AM, Blogger SL said...

Mto bem!Achar a concentração ideal pode não ser fácil, sendo que por vezes pequenas variações podem alterar todo um metabolismo celular, não sei se acontece isso com a Pichia...

 
At 3:30 AM, Blogger Uruk Riot said...

De facto há um grande compromisso entre a concentração suficiente para assegurar a indução máxima e a toxicidade. Mas diz a literatura que desde que não ultrapassemos o 1% de metanol, tudo está bem a nível da toxicidade. Agora, qual a percentagem para uma indução perfeita acho que ninguém sabe, e infelizmente não vou testar esta vertente, pois mesmo que haja alguma toxicidade havendo o sacrifico de algumas células em prole do aumento da produtividade, acho que seria uma actividade interessante a ser explorada. Porém muito difícil, pois para piorar as coisas esta percentagem depende também muito da proteína heteróloga que queremos produzir. Eu estou a usar 0,5% de metanol, apenas por ser uma concentração que na literatura demonstra bons resultados, e por estar bastante longe da toxicidade. Mas é que pequenas variações de metanol podem alterar em grande o metabolismo celular, não tenhas duvidas disso, principalmente se tivermos em consideração o nível de formação do nosso produto de interesse. Mas isso já não acontece com o pH. Talvez fale sobre isso no próximo post.

 

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