Thursday, February 23, 2006

Diário de um Fermentador - Dia 1

Eu, um jovial fermentador, decidi começar a fermentar coisas giras! Pesquisei, e eis que encontro as Proteínas Elastoméricas!
Apesar de para muitos ser uma novidade este nome, a verdade é que todos nós já as vimos, as possuímos e as já estudamos, visto que estas proteínas estão presentes num largo espectro de espécies animais e tecidos. Porém estas já não são tão abundantes nas espécies vegetais, sendo o único sistema bem documentado as proteínas de gluteína no trigo. As proteínas elastoméricas evoluíram de forma a possuírem propriedades que lhes permitem realizar funções biológicas específicas. Assim, não possuem a estrutura terciária a que estamos habituados a visualizar nas diversas proteínas, que possuem uma amálgama de motivos constituídos por um aglomerado de alfa hélices e folhas beta pregueadas. São sim constituídas apenas por uma forma básica, ou alfa hélice ou folha beta pregueada. Isto deve-se ao facto de estas proteínas terem origem numa sequência altamente repetitiva de poucos monómeros diferentes. Por exemplo, uma proteína elastomérica pode ser constituída por apenas dois aminoácidos, como a tirosina e alanina, repetidos um cem número de vezes da seguinte forma Tyr-Ala-Tyr-Ala-Tyr-Ala- e pronto passávamos o dia nisto.
Todas as proteínas elastoméricas possuem elasticidade semelhante à borracha, podendo sofrer altos níveis de deformação sem se verificar nenhuma ruptura, armazenando a energia envolvida na deformação e depois recuperarem ao seu estado original. Esta característica rubber-like está relacionada com a sua estrutura de polímeros e tem de satisfazer dois critérios. Primeiro, os monómeros individuais têm de ser flexíveis e livres em termos conformacionais, para que possam responder prontamente a uma força aplicada. Segundo, os mononómeros têm de estar crosslinked para formarem uma rede. Sendo este crosslinks de origem covalente ou nem por isso, e a maioria das proteínas elastoméricas têm evoluído de forma a possuir domínios elastoméricos que formam crosslinks.
Alguns exemplos de proteínas elastoméricas que achei mais engraçados e corriqueiros são:
A elastina, que está largamente distribuída nos tecidos dos vertebrados, desempenhando um papel dinâmico essencial nas artérias.
A abductina que ocorre nos moluscos bivalves, formando o ligamento interno da charneira, tendo uma acção antagonista à acção do musculo adutor, abrindo a concha quando este relaxa. Esta acção foi desenvolvida para permitir que algumas conchas consigam nadar alguns metros de cada vez. Para os bivalves se aguentarem agarrados ao substracto durante as marés, usam as proteínas em forma de fio denominadas de bissais, que também são proteínas elastoméricas.
Outras proteínas, constituem as sedas produzidas pelas aranhas, que se dividem em dois tipos principais, as que usam para formar as linhas que usam para suavemente descerem sobre as cabeças das pessoas, que é a mesma que usam como base estrutural para a teia; e a seda flageliforme que forma a espiral da teia responsável captura. As primeiras são mais rijas e são capazes de se estender aproximadamente 30%, enquanto as sedas flageliformes são capazes de sofrer extensões de cerca de 200% do seu tamanho sem quebrarem. A combinação de diferentes sedas permite à aranha produzir proteínas com diferentes propriedades mecânicas permitindo que teia absorva o impacto do insecto sem o catapultar para os quintos do caneco.
A tetina ou conectina é uma das proteínas do sarcómero que é responsável pela sua elasticidade e manutenção da sua integridade. Está assim associada a miofibrilas do músculo estriado e na estrutura muscular. Possui diferentes isoformas consoante o tecido a que está associado (por exemplo: músculo cardíaco ou músculo esquelético).
A “cola de sapo” é secretada nas costas dos sapos australianos do género Noteden quando estes são provocados. Esta mistura de proteínas elastoméricas de cor amarelada é uma cola sólida que funciona muito bem sobre uma série de superfícies como o vidro, metais, cartão, madeira e plástico, mesmo em condições molhadas! Estas características despertaram grande interesse na indústria biomédica visto que os presentes adesivos biológicos (fibrina, albumina, etc.) sofrem de fraca força de ligação e em alguns casos são derivados de compostos do sangue, com o risco associado de contaminação por parte de vírus ou piriões. Por outro lado as colas sintéticas (por exemplo: adesivos cianoacrilatos) são muito fortes mas também são tóxicos para tecidos vivos e formam filmes rijos desprovidos de poros que podem impedir a cura das feridas.
Bem, chega de exemplos, agora vou-vos mostrar o que acho mais fascinante nestas proteínas, a porta para o mundo mágico onde elas podem muito bem ser a primeira chave.
Resumidamente, os movimentos realizados pelas proteínas (maioria das proteínas) resultam da alteração das associações hidrofóbicas que podem originar deformações e relaxamentos dos segmentos das cadeias de proteína que podem ser convertidos em trabalho mecânico. Sim trabalho mecânico! A alteração das associações são também capazes de realizar um largo espectro de outras formas de trabalho, nomeadamente trabalho químico. Assim as proteínas são as verdadeiras nonomáquinas das células movidas por forças pelas forças hidrofóbicas de associação/dissociação.
As proteínas elastoméricas são uma importante fonte de conhecimento pioneiro para entendermos estas forças e como podemos controlá-las. Sim porque é possível controlar o trabalho realizado por uma proteína elastomérica! E vejam como é fácil! Basta alterar o pH da solução, ou a temperatura (e em raros casos até mesmo a concentração salina do meio) para que uma proteína elastomérica perfeitamente inerte, se mova e realize trabalho mecânico de qualquer espécie! Imaginem as potencialidades!
Sim sem duvida decidi que devo produzir estas proteínas, pois além dos grandes avanços e revoluções que nos podem vir a trazer no futuro, têm também uma utilidade imediata, nomeadamente em biomaterias, visto que são perfeitamente biocompatíveis, sendo possível a formação de padrões de glicosilação que podem ser aceites pelos hospedeiros humanos. E até mesmo para ser utilizado como plásticos verdes em para choques de automóveis! Ora isto sim é interessante!
Mas acho já chega por hoje…

3 Comments:

At 11:26 AM, Blogger SL said...

Ehehe k bem...realmente é interessante! Força no fermentador! Espero k a sra Pichia colabore bem!

 
At 9:06 AM, Blogger Uruk Riot said...

Muito obrigado! A Sra. Pichia será descrita no próximo dia do diário! Decerto que vai estar à altura!

 
At 11:27 AM, Blogger Loira said...

Até te brilham os olhitos sempre que falas na Pichia...isso é que é amor! =)

 

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